O acidente com a usina nuclear em Fukushima, no Japão, assombra a população em todos os hemisférios, coloca em xeque programas nucleares em todo o mundo e reforça os movimentos contrários ao uso desse tipo de energia. O especialista japonês Hirose Takashi, em entrevista à rede de televisão japonesa Asahi Newstar, difundida mundialmente, afirma que tanto o governo japonês como a imprensa mascaram a gravidade dos acontecimentos.
E mais, que os procedimentos adotados quanto à obstrução dos vazamentos são um equívoco, só contribuem para intensificar a dimensão da catástrofe e os efeitos nocivos da radioatividade sobre a população.
Na opinião do professor Roberto Meigikos dos Anjos(*), do Instituto de Física da Universidade Federal Fluminense e coordenador do Laboratório de Radioecologia (Lara), o inquestionável é que o acidente ocorrido no Japão impõe novos paradigmas quanto às regras mundiais de segurança nuclear.
Segundo ele, impacto similar aconteceu em 1986, ao norte da Ucrânia, com a usina de Chernobyl, hoje uma cidade-fantasma, cuja contaminação atmosférica foi, proporcionalmente, 400 vezes maior do que o bombardeio de Hiroshima e Nagasaki, na Segunda Guerra Mundial. Naquela época, a indústria nuclear sofreu um duro golpe, por meio do aumento de ações politicas e sociais contrárias aos programas nucleares, que resultaram numa queda significativa do numero de usinas nucleares em construção já no final da década de 1990. Portanto, o desastre em Fukushima traz à pauta uma retomada dessa discussão.
Quanto aos os efeitos biológicos da radiação, podem ser de vários tipos, uma vez que os elementos radioativos emitidos pela usina configuram-se em partículas invisíveis que podem ser incorporadas à atmosfera, água e alimentos, podendo ser inaladas ou ingeridas pela água ou alimentos contaminados. Não têm cheiro ou cor, e quanto maior a exposição, maior é a probabilidade de ocorrências de efeitos nocivos à saúde. O manifesto de tais efeitos é tardio, podendo ocorrer em meses ou até mesmo em anos após a contaminação. “Assim, é extremamente importante desenvolver estudos sobre as fontes, transporte, destino e efeitos de substâncias radioativas no ar, solo, água, plantas e tecidos animais.”
O professor Roberto Meigikos diz que ainda não é possível se ter a noção exata da dimensão e gravidade do acidente no Japão, uma vez que os vazamentos radioativos ainda não foram contidos, e o grau de exposição à radioatividade nos arredores da central nuclear vem aumentando a cada dia. Como pesquisador e especialista em radioatividade e efeitos da radiação, afirma que as probabilidades de que seus efeitos atinjam o Brasil são extremamente baixas. “Diferentemente do ocorrido em Chernobyl, não temos uma ‘pluma radioativa’ intensa sendo emanada do Japão. Mesmo durante o acidente de Chernobyl não tivemos grandes precipitações de materiais radioativos, uma vez que a Cordilheira dos Antes tem sido uma grande barreira aos poluentes radioativos vindos do Pacífico. O risco em maior grau deve ficar restrito ao redor do Japão, em regiões do entorno da usina. Em nosso caso, devemos ficar mais preocupados com a ingestão de possíveis alimentos contaminados oriundos do Japão.”
Angra I e Angra II - Com relação às duas usinas nucleares brasileiras em funcionamento no Rio de Janeiro, Angra I e Angra II, o professor Roberto Meigikos considera muito pequeno o risco de acidentes, o que não significa que não necessitemos rever os protocolos de segurança destas usinas. “A tragédia no Japão nos ensinou que não devemos desprezar os efeitos de catástrofes naturais em nossas instalações. A Região Serrana do Rio de Janeiro também nos ensinou que devemos estar atentos aos descasos em que se encontram nossas encostas, aos leitos de rios que são desviados sem estudos prévios, enfim, ao nosso meio ambiente. Numa situação de emergência nuclear em Angra, um dos problemas está na topografia local. A Rodovia BR 101 (Rio-Santos) nunca foi duplicada no entorno da central nuclear de Angra dos Reis. Mesmo após a construção de Angra I e II foi permitida a construção de vários condomínios, hotéis e a ocupação irregular de encostas. Hoje se fala na criação de uma rota alternativa de fuga pelo mar em caso de acidente nuclear. Entretanto, é necessário ter em mente que são necessárias várias rotas para a remoção de centenas de milhares de pessoas, que estarão alteradas devido a uma situação de pânico.”
Embora acreditando que ainda existam muitos meios e muitas outras fontes de energia que ainda têm grande potencial para serem exploradas, e que o custo do descomissionamento de instalações nucleares é elevado (uma usina nuclear tem uma vida útil de cerca de 50 anos, depois disso deve ser desativada), ele afirma que o uso de técnicas nucleares não deve ser desprezado. “Reatores são muito importantes na obtenção de radioisótopos, que são usados, por exemplo, em tratamentos de câncer. Radiodiagnósticos são fundamentais para a saúde dos indivíduos. Diante dos fatos, sem dúvida, este é um momento propício em que se devem rediscutir tanto as normas e protocolos de segurança nuclear, bem como a real necessidade de aumentarmos em curto prazo o uso dessa fonte de energia.”
(*) Roberto Meigikos dos Anjos - Doutor em Física pela Universidade de São Paulo (1992). Foi pesquisador-visitante em diversas ocasiões no Laboratório Tandar e na UNSL (ambos na Argentina) e ANU (Austrália). Atualmente, é professor-associado do Instituto de Física da Universidade Federal Fluminense, onde coordena o Laboratório de Radioecologia (Lara). Telefones de contato: (21) 2629-5770 e 2629-5843.
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Agência UFF de Notícias
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